TDAH , Ansiedade e Depressão, qual a relação entre eles?
- Giovanna Mayoral
- 15 de out. de 2024
- 15 min de leitura
Atualizado: 23 de nov. de 2024
Considerações sobre Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade;
Mentes Inquietas, de Dra Ana Beatriz Barbosa.
Relação entre TDAH e Ansiedade Generalizada - TAG
A ansiedade generalizada é o transtorno da preocupação interminável e ruminante. Está presente naquelas pessoas que se organizam em torno da antecipação de problemas e ficam sondando o ambiente à caça de perigos e complicações. Tão logo o indivíduo ansioso consiga resolver algo que o aflige, imediatamente parte em busca de outra aflição. É um estado constante de preocupação e alerta, uma ansiedade crônica que leva a pessoa a começar o dia em busca de algum motivo de preocupação desnecessária — não importando se o problema é trivial ou doloroso. Como não consegue relaxar, permanece pairando em um mal-estar indefinível e subjetivo que, por vezes, se manifesta em variados problemas somáticos (físicos), quase sempre causados por uma sobrecarga de adrenalina imposta ao organismo. Observe o que acontece quando alguém tem, ao mesmo tempo, TDA e transtorno de ansiedade generalizada (TAG).
Imagine aquela TDA distraída, que vive esquecendo suas coisas pelos cantos, incluindo documentos importantes de trabalho. Conhecendo bem essa sua incômoda característica, que já a colocou em várias saias justas, ela se põe em estado de alerta o tempo todo. Fareja o ambiente, mexe e remexe nas gavetas, vasculha constantemente a bolsa. Se, por uma fração de segundo, pensa que algo está faltando ou fora do lugar, imediatamente o coração dispara, a respiração fica ofegante, e o sangue parece fugir do rosto. Não era nada de mais outra vez: o documento que procurava estava ali, entre outros papéis da pasta. Mas o estrago já foi feito, e o mal-estar e a tensão poderão acompanhá-la pelo resto do dia.
Bem, pode-se pensar: já que ela é assim tão distraída, talvez seja bom que tenha esse jeito preocupado.
O fato é que muitos TDAs se organizam em torno da própria ansiedade. A ansiedade é, por vezes, tremendamente estruturadora; e estrutura é tudo de que um TDA precisa, uma vez que é desorganizado. Mas como assim?
A ansiedade envolvida na sensação de que algo está sempre errado direciona a atenção do TDA. Ele se concentra na procura de tais problemas potenciais. E, se não houver um, é capaz de arrumar. Ou então transforma algo corriqueiro em um problemão. Essa preocupação infindável aumenta a acuidade de seu sistema atentivo e força sua área pré-frontal (fronte) a monitorar os estímulos e o ambiente, como os olhos de uma águia à procura de presas. Ante a incômoda alternativa de se sentir invadido por estímulos incesantes, variados e irrelevantes, o TDA ansioso prefere a igualmente incômoda sensação de se ver bombardeado por estímulos variados catalisadores de preocupação, mas que, pelo menos, não considera irrelevantes. Claro que essa preferência não é intencional, tampouco ativamente consciente.
Mas o mal-estar e o estado de alerta parecem ser melhores do que se sentir assoberbado e confuso.
Logo, é necessário voltar àquela suposição: seria melhor ter esse jeito preocupado do que ser desorganizado?
Decididamente, não. Há outros modos mais saudáveis e produtivos para um TDA se organizar que não impliquem tanto desgaste. Responder sim a essa pergunta seria permitir a substituição de uma sobrecarga pela outra, o forno pela frigideira. A ansiedade generalizada, quando se torna crônica, arrasta o sujeito de volta ao ponto inicial que aflige um TDA: ter dificuldades em se concentrar, falhas de memória e muito, muito desconforto físico e mental. É o mesmo que beber água do mar quando se está com sede. Ao final, ele ficará desidratado, e seu organismo desequilibrado e em perigo. É correr em círculos, atrás da própria sombra: estará exausto, sem sair do ponto de partida.
O desconforto é tamanho que leva muitos indivíduos a procurar ajuda médica. E assim temos descoberto vários TDAs.
Eles costumam procurar ajuda, obviamente, para a ansiedade generalizada. No entanto, após criteriosa "garimpagem" diagnóstica, é possível encontrar o transtorno do déficit de atenção, ali escondido, em meio aos cascalhos da ansiedade. Muitas vezes, tratando-se o comportamento TDA, os sintomas de ansiedade decrescem acentuadamente.
Por fim, é importante saber diferenciar o transtorno de ansiedade generalizada (TAG) da ansiedade difusa e oscilante que normalmente acompanha o TDA. Um critério bastante sólido para distinguir uma de outra é a constância desse estado de ansiedade.
Um TDA, com frequência, atravessa seus picos de ansiedade, mas, se esta perdura por no mínimo seis meses e traz desconforto significativo, pode-se começar a levantar a suspeita de comorbidade (transtorno associado).
Relação entre TDAH e depressão
Em uma pessoa com TDA, a depressão pode se desenvolver de forma secundária ao desconforto provocado pelo comportamento TDA, como também pode surgir primariamente em função de alterações neuroquímicas e/ou funcionais semelhantes.
Inicialmente, falarei um pouco da primeira condição.
Não é muito difícil imaginar a relação do TDA com estados depressivos. Como tenho realçado repetidamente neste livro, a pessoa com TDA, na grande maioria das vezes, tem baixa auto-estima. Ela desenvolve um baixo conceito de si mesma, não só pelas referências externas que recebe, mas também por críticas, repreensões, castigos, comentários depreciativos acerca de suas características e tantos outros sinais sociais negativos. Além disso, ela se pauta em seus referenciais internos, no que sente em si mesma: suas dificuldades cotidianas de organização, a tendência a protelar tarefas, a desatenção, os erros bobos, a impulsividade e as inúmeras gafes consequentes desta, a inquietação, os esquecimentos e a penetrante sensação de baixo rendimento.
Ela se autodefine na frase "eu sou inadequada" e acaba mergulhando no pessimismo persistente que a acompanha, embora seja teimosa o bastante para continuar insistindo. Assim, resumidamente, um TDA não tem uma opinião favorável de si mesmo, nem do mundo e das pessoas que o cercam; afinal, por várias vezes e em fases críticas de sua vida, não recebeu reforços sociais. E, caso os tenha recebido, não os percebeu ou simplesmente os desconsiderou ou não os valorizou como deveria. Assim, ele já não avalia muito bem o impacto positivo que causa nas pessoas e no ambiente; só consegue ver o lado negativo ou o que julga ser inconveniente.
Sua vibração contagiante, sua criatividade e seu carisma podem ser percebidos por todos, menos por ele mesmo. É como se estivesse perdido em uma sala de espelhos modificados de um parque de diversões vendo imagens distorcidas de si mesmo..
A partir daí, não fica difícil concluir que essa pessoa seja tremendamente desesperançada em relação ao futuro e à sua capacidade de enfrentá-lo. O futuro é um monstro à espreita na esquina, e, mesmo que essa pessoa dobre muitas esquinas da vida com eficiência, ainda acredita que foi por sorte, e não por sua capacidade. Para ela, o monstro pode saltar a qualquer momento.
Essa situação muito comum de se sentir "remando contra a maré" predispõe o TDA a um estado de depressão que, a meu ver, representa muito mais um estado de exaustão em função da grande quantidade de energia despendida pelo próprio comportamento e pelo funcionamento mental e suas consequências cotidianas nos diversos âmbitos da vida (protissional, social, afetivo e familiar).
Por outro ângulo, temos o fato de que, provavelmente, TDA e depressão compartilhem alterações semelhantes (veja o capítulo 12, sobre a origem do TDA). Estudos sugerem tal possibilidade, já que alguns medicamentos antidepressivos também se mostram eficazes no tratamento do transtorno do déficit de atenção quando prescritos em baixas doses. Assim, é bastante provável que as duas condições coexistam em quem seja biologicamente vulnerável. E os sintomas de uma acabem por agravar os da outra, e vice-versa.
De fato, já me deparei com vários casos de depressão em que, após criteriosa investigação, se revelou também o transtorno do déficit de atenção, até então oculto pelos sintomas mais evidentes das alterações no humor. Aliás, é necessário que o médico seja bastante cuidadoso com a questão da instabilidade humoral. Normalmente, o indivíduo com TDA já apresenta oscilações de humor bastante acentuadas — às vezes, em curtos espaços de tempo. Diferenciar esse "sobe e desce" afetivo, característico do TDA, de um quadro realmente depressivo é de importância vital, pois implica alterar até a conduta medicamentosa.
Sobre o tratamento
A meu ver, o critério de tratamento do transtorno do déficit de atenção deve basear-se na dialética CONFORTO X DESCONFORTO. Assim sendo, os próprios indivíduos TDAs devem avaliar se sua forma de viver, pensar ou agir está lhes proporcionando uma existência confortável ou não.
No caso dos adultos, a autoavaliação torna-se mais fácil por meio da própria observação advinda das sucessivas frustrações e/ou limitações nos principais setores vitais: social, afetivo, familiar e profissional. Porém, quando se trata de crianças e adolescentes TDAs, é necessário contar com a valiosa ajuda de pais e/ou cuidadores na descrição de comportamentos que sinalizam grande inadaptação e sofrimento por parte desses pequenos e inquietos seres. Não se pode esquecer que todo sofrimento tem sua expressão, consciente ou não; não ter consciência de estar sofrendo não minimiza em nada o sofrimento e as consequências advindas dessa maneira de viver.
Por tudo o que foi dito, costumo dividir o tratamento do TDA em quatro grandes etapas: informação/conhecimento, apoio técnico, terapêutica medicamentosa e psicoterapia.
A seguir, cada uma delas será vista individualmente. É importante salientar que muitos autores incluem o diagnóstico como etapa do tratamento do TDA. Isso é bastante compreensível, uma vez que, nesses casos, o diagnóstico quase sempre vem acompanhado de um caráter libertário que, por si só, produz efeitos terapêuticos. Afinal, saber que existe uma explicação científica para tantos equívocos, frustrações e até humilhações é, no mínimo, balsâmico para uma autoestima já tão abalada. E mais: tomar consciência de que esse comportamento pode ser
"regulado", tal qual um sofisticado motor na direção de seu melhor rendimento, faz criar na alma TDA o mais potente dos combustíveis humanos: a esperança, que ressuscita nesses impulsivos criadores a capacidade de acalentar sonhos possíveis.
Informação/conhecimento
"Saber é poder." O velho e sentencioso ditado nunca esteve tão atual como nos tempos globalizados. Afinal, só é possível optar por uma ajuda adequada por meio do saber advindo do conhecimento adquirido.
Quanto mais informação e conhecimento você tiver sobre o transtorno do déficit de atenção, mais capacitado estará para compreender toda a sua história de vida e contribuir efetivamente para a elaboração de um tratamento que lhe seja mais eficaz e confortável. Lembre-se de que nenhum tratamento eficiente pode nascer de posturas passivas. É preciso se informar, estudar, debater, trocar ideias, experiências, conhecer sobre remédios, terapias, alimentação, esportes e tudo o mais que possa contribuir para a melhora e a autossuperação.
Por isso, na hora de escolher um médico e/ou um terapeuta, procure saber se possuem profundo conhecimento sobre TDA, pois isso tornará o diálogo mais fácil e franco e eles estarão a seu lado no árduo trabalho de construção e reconstrução de sua vida. Tente imaginar que ambos fazem parte de uma grande equipe de Fórmula 1 cujo objetivo primordial é permitir ao carro da escuderia (no caso, você) apresentar nas pistas (no caso, em sua vida) o seu melhor desempenho. Sua mente pode ter um imenso potencial, mas, se não for bem "regulada", pode apresentar resultados muito aquém do esperado. Isso acabará por trazer frustrações à bagagem de sua experiência vital.
Mais do que enriquecimento cultural, a informação sobre o funcionamento TDA trará conhecimento que o auxiliará na compreensão de como o transtorno afeta sua vida e a de todos os que se encontram ao seu redor. Nesse aspecto, estender a informação e o conhecimento a familiares, amigos, professores, colegas de trabalho e parceiros afetivos só contribuirá de maneira positiva, uma vez que a convivência, a partir de então, será muito menos desgastante e, com certeza, mais compreensiva e produtiva.
Apoio técnico
Apoio técnico pode, em princípio, causar uma impressão errônea de algo burocrático e complicado que fará de sua vida uma grande tormenta. Mas, ao contrário do que possa parecer, ele nada mais é do que um conjunto de pequenas medidas e atitudes que acabam por criar, para o TDA, uma estrutura externa capaz de facilitar em muito o seu cotidiano.
Dessa maneira, o apoio técnico consiste em criar uma rotina pessoal que facilite a vida prática de um TDA e seja capaz de compensar, em parte, a sua desorganização interna. Se você é um deles ou apresenta características típicas, procure seguir os seguintes aspectos:
→ Estabeleça horários regulares de maior produtividade, de repouso, de atividades físicas e de refeições.
→ Organize cronogramas em relação a suas obrigações, projetos e lazer.
→ Crie o hábito de ter uma agenda em que você anote, na véspera, os compromissos do dia seguinte, e confira tudo pela manhã antes de iniciar seu dia.
→ Tenha sempre à mão blocos e canetas para pequenos lembretes, anotações e listas.
No início, você poderá ter um pouco de dificuldade em seguir uma rotina, mas, em pouco tempo, isso se tornará um hábito que lhe trará conforto e segurança e, principalmente, impedirá que você se perca em devaneios e ações sem objetivos ou que gire em torno do seu próprio eixo sem sair do lugar.
Além de diminuir bastante a ansiedade e a sensação de incapacidade do TDA, uma rotina bem organizada pode permitir que talentos sejam desenvolvidos, aperfeiçoados e expressos de forma concreta.
Se você não se sentir capaz de organizar seu apoio técnico sozinho, peça a ajuda das pessoas que convivem com você. Elas poderão lhe fornecer informações sobre seu funcionamento com maior precisão e pertinência do que você imagina. Recorra também ao seu terapeuta. Apesar de a terapia ter o objetivo principal de construir uma organização interna, como se verá adiante, muitas vezes é mais fácil e oportuno começar pela estruturação externa para se chegar ao mesmo fim.
Terapêutica medicamentosa
Falar sobre uma terapêutica medicamentosa sempre causa polêmica. De um lado, as pessoas contrárias ao uso de remédios e, de outro, aquelas que reconheciam a necessidade e a eficácia que o uso de medicamentos podia trazer a determinadas pessoas.
Por mais curioso que possa parecer, as pessoas ditas contrárias ao uso de medicação costumavam se autointitular "naturalistas". Afirmavam que só se deveriam usar remédios "naturais". Pois bem, durante todo esse tempo, tenho me questionado sobre o que essas pessoas chamam de "natural". Afinal, natural é tudo o que vem da natureza; sendo assim, veneno de cobra é natural, bem como os raios solares; no entanto, ambos podem matar em determinadas circunstâncias, como podem salvar vidas em outras. Será que a polêmica em torno de natural e não natural não seria sobre industrializado e não industrializado?
A meu ver, a polêmica persiste por pura falta de informação e conhecimento de alguns segmentos sociais que, mesmo sem embasamento científico, se sentem autoridade no assunto. Certamente o processo de industrialização teve e tem distorções e efeitos maléficos, mas ignorá-lo sob seu aspecto positivo — proporcionar alívio ao sofrimento humano em todas as esferas — é ser radicalmente insensato. Foi por meio do processo de industrialização de vacinas que se erradicaram inúmeras doenças que tanto afligiram a humanidade.
Não me estenderei mais sobre esse assunto, uma vez que não é objeto deste livro; no entanto, sinto-me na obrigação de des-acá-lo, pois, frequentemente e até hoje, crenças e conceitos falsos impedem que milhares de pessoas experimentem uma existência mais confortável.
Devemos lembrar que o sofrimento humano não segue correntes filosóficas ou científicas; apenas busca uma saída que contribua para o seu alívio. Assim, os esforços para esse fim devem ter caráter somatório, ou seja, reunir todas as condutas terapêuticas, visando ao bem-estar de cada indivíduo, como único e primordial objetivo do processo a que se chama tratamento.
Sob esse enfoque, o uso de medicamentos no transtorno do déficit de atenção pode e deve ser visto como uma ferramenta a mais na busca de melhor qualidade de vida. Tal qual o motor de um automóvel cujo desempenho é melhorado pelo uso de um bom óleo lubrificante que diminui o atrito de suas peças, o cérebro TDA pode ter seu funcionamento facilitado por meio da medicação, contribuindo para que o indivíduo TDA viva de maneira menos desgastante.
O uso de medicamentos no TDA costuma produzir resultados eficazes na grande maioria dos casos, contribuindo para uma mudança radical na vida de tais pessoas. Para que isso ocorra, é fundamental que se definam os sintomas causadores de maior desconforto, em cada caso ou situação, da maneira mais objetiva possível. Isso acontece pelo fato de o TDA ser um transtorno que pode se apresentar de diversas formas e ainda ter uma série de comorbidades acopladas ao seu funcionamento basal.
Definir o que se deseja melhorar no comportamento vital de um TDA é essencial na escolha mais adequada de um medica-mento. Por isso, o médico deve contar com a participação ativa do paciente ou de seus cuidadores (em caso de crianças) para atingir seu objetivo final.
Existem basicamente três categorias de medicamentos que podem ser usados no tratamento do TDA: 1) os estimulantes; 2) os antidepressivos; 3) os acessórios. Muitas vezes, é necessária uma combinação para se produzir um efeito adequado. As medicações são as mesmas para adultos e crianças; a diferença encontra-se na dose utilizada e na combinação indicada para cada caso.
Psicoterapia
Normalmente, a imagem do terapeuta que mergulha fundo no passado e na infância de seu paciente esperando encontrar as respostas e as causas dos males que o afligem no presente é a figura mais comum e sedimentada no imaginário popular para representar o processo de tratamento da psicoterapia. No entanto, em minha experiência, tenho tido a oportunidade de observar que não é esse o procedimento mais adequado para os pacientes TDAs.
É óbvio que os TDAs, como toda e qualquer pessoa, sofrem com problemas de fundo emocional, passaram por experiências significativas durante a infância e em família e conservam suas marcas por toda a vida. Mas, quando se pensa nas causas ou nas origens das dificuldades de um TDA, incluindo aí não apenas baixa autoestima, mas também problemas práticos, como desorganização, não se pode jamais esquecer que a origem é biológica. Há um substrato biológico que determina o funcionamento mental TDA e está indiretamente por trás da maioria dos problemas emocionais das pessoas com TDA.
Posso citar vários casos em que TDAs padecem sob o peso de uma crônica baixa autoestima. Certamente, a maior parte deles desenvolveu essa autoimagem negativa em consequência de anos de crítica e incompreensão por parte de familiares, professores e pessoas de convivência próxima. Mas, mesmo que tivessem tido a sorte de contar com um ambiente familiar e educacional favorável e incentivador, ainda assim enfrentariam dificuldades com sua tendência à distração, aos esquecimentos, à impulsividade e à desorganização característicos do TDA. Em suma, em algum momento desenvolveriam uma desagradável autopercepção de inadequação e incapacidade — principalmente no momento em que, já adultos, precisariam agir por conta própria e assumir responsabilidades crescentes.
Em sintese, acredito que psicoterapias voltadas para a busca de insight e discussão de vivências infantis não promovam o alívio do desconforto nem a estruturação de que um TDA necessita. É preciso que a psicoterapia para casos de TDA seja diretiva, objetiva, estruturada e orientada a metas. Uma abordagem psicoterápica dotada dessas características, e que considero particularmente útil para o TDA, além de vários outros transtornos, é a chamada terapia cognitivo-comportamental (TCC).
Essa abordagem psicoterápica caracteriza-se pela busca de mudanças em afetos e comportamentos por meio da chamada reestruturação cognitiva, isto é, substituir crenças, pensamentos e formas de interpretar as situações negativistas e disfuncionais por outras formas de pensar e perceber o mundo menos depressogênicas/ansiogênicas e mais baseadas na realidade. Além disso, o paciente também é instruído a realizar "tarefas de casa" e planejar com o terapeuta um conjunto de atividades que incluem desde enfrentamentos graduais de situações que ele se considera incapaz de realizar até o estabelecimento de uma agenda que estruture rotinas de atividades a fim de proporcionar prazer e satisfação. Assim, resumidamente, o paciente, além de ser educado sobre seu problema, é instruído a mudar comportamentos e formas de interpretar e perceber situações irrealistas e desadaptativas que estejam contribuindo para manter ou agravar seu problema, ou mesmo para deflagrar o transtorno.
Principais focos da terapia
Para casos de TDA, alguns focos específicos para intervenção já podem ser previamente delineados, embora a forma e o ritmo com que esses focos serão abordados devam ser cuidadosamente adaptados pelo terapeuta a cada paciente.
De uma maneira geral, o terapeuta cognitivo-comportamental trabalhará com treino em solução de problemas, treino em habilidades sociais, relaxamento, estabelecimento de agendas de atividades rotineiras e de objetivos e reestruturação de formas de pensar e lidar com problemas que podem estar sendo prejudiciais.
Os treinos em solução de problemas e em habilidades sociais visam minimizar os comportamentos impulsivos que estejam influindo negativamente em suas relações sociais e em seus afazeres cotidianos. O treino em solução de problemas tem particular importância para aqueles DAs intensamente ansiosos e desorientados diante do surgimento de algum problema, real ou imaginário. Essa técnica consiste em treinar o paciente TDA a identificar de modo claro um problema, gerar diversas soluções possíveis e escolher a que lhe parece mais adequada. Assim, o paciente TDA habitua-se a ponderar cuidadosamente, em vez de reagir na base do impulso sem antes ter avaliado as possíveis consequências.
Um objetivo importante seria aumentar o nível de tolerância à frustração
Outro impacto positivo seria o de minimizar a típica ruminação ansiosa na qual os TDAs mergulham quando precisam cumprir algo ou resolver determinado problema. Deixar-se tomar pela expectativa ansiosa em vez de estabelecer possíveis soluções pode paralisar o TDA ou fazê-lo adiar a resolução do problema, o que aumentará a ansiedade ainda mais.
Já o treino em habilidades sociais tem como objetivo melhorar a qualidade das interações sociais de um TDA, minimizando o impacto de atitudes e falas impulsivas e irrefletidas que criam dificuldades nos relacionamentos. Mais uma vez, o TDA é instruído a planejar, passo a passo, formas de abordar e resolver problemas de interação, além de tentar compreender o ponto de vista dos outros e não interpretar precipitadamente suas atitudes e intenções. Obviamente, isso inclui o treinamento em assertividade, que consiste em defender seus próprios pontos de vista e direitos de maneira respeitosa e ponderada. A ansiedade e o senso de inadequação que acompanham o TDA podem fazê-lo ora engolir sapos, ora reagir explosivamente. Com exercícios adequados e empenho, o TDA aprende a seguir o caminho do meio.
O treino em relaxamento também é direcionado para minimizar o impacto da ansiedade e de suas manifestações somáticas (físicas), como taquicardia, tensão muscular, tremores e outras sensações desagradáveis. Ele inclui reeducação da respiração, da postura e o aprendizado de alguma técnica de relaxamento a ser empregada com regularidade.
Um componente da terapia especialmente importante para pacientes TDAs refere-se ao estabelecimento de uma agenda de atividades semanais, que sejam definidos horários fixos e devem incluir exercícios físicos ou a prática de algum esporte.
Os exercícios físicos são fundamentais para o manejo do estresse. Nesse ponto, pode-se tentar estabelecer também uma reeducação alimentar, por meio da diminuição da ingestão de substâncias prejudiciais, como a cafeína.
O estabelecimento de agendas cumpre a função de estruturar tarefas e atividades de um TDA, de modo a impedir que se enrede em sua própria desorganização e fique pulando de uma atividade inacabada para outra. Os efeitos benéficos mostram-se em um aumento tanto de produtividade como no senso de autodomínio experimentado pelo paciente. A falta de organização e estruturação aliada à ansiedade pode causar, no TDA, a sensação de ser como uma barata tonta. Ele não sabe se vai ou se volta e acaba parado no mesmo lugar, sem resolver o problema e em crescente ansiedade.
Horários e atividades estabelecidos ajudam a diminuir o senso de caos interno e externo.
Livro:
Mentes Inquietas: TDAH: desatenção,
hiperatividade e impulsividade
Vídeo sobre TDAH: